terça-feira, 30 de setembro de 2014

Arquétipo do Visionário


Arquétipo do Visionário

“Se você não dá expressão às suas próprias idéias,

se não dá ouvidos a seu próprio ser, você trai a si mesmo.” Rollo May

 

                Em março deste ano escrevi sobre o arquétipo do guerreiro, presente em todas as culturas, segundo a antropóloga Angeles Ariens. Arquétipos são estruturas inconscientes existentes na psique coletiva da humanidade. Ariens em sua pesquisa transcultural consegue traçar paralelos, enxergar a interface de aspectos que permeiam os primeiros povos de todo planeta e nossa civilização ocidental. Nessa enxurrada de informações, opiniões e notícias que nos assaltam todos os dias, não podemos esquecer de que existe algo que vem de dentro, algo que sabe e algo que vê, uma parte nossa que intui, é instintiva e que pode ter sido ocultada pelos excessos que cometemos.

                No caminho quádruplo, Ariens torna acessível a sabedoria dos povos nativos vinda de um contato maior com a natureza e seus ciclos, contato esse que também temos, mas que encobrimos devido a nosso estilo de vida urbano. Além do guerreiro, os arquétipos do visionário, curador e mestre são presentes em nós, adormecidos ou não. Nossos instintos nos ajudam a viver, trazem a força necessária à sobrevivência. Viver apenas no intelecto ou na emoção não trazem a ação para a  conquista de seu próprio espaço de realização na vida.

                Pelo caminho do Visionário é possível expressar a criatividade trazendo ao mundo uma visão pessoal. Segundo os nativos cada pessoa possui um sagrado ponto de vista. Todos são valorizados desde a criança até os mais velhos. A criança traz a pureza e autenticidade das emoções e os mais velhos a experiência de vida, a sabedoria. Homens e mulheres, jovens e adultos, todos tem suas visões e ideais e quando expressos formam uma visão coletiva da comunidade.

                Numa organização, faz parte do planejamento estratégico encontrar a missão, a visão e os valores que guiarão as pessoas que trabalham nela, balizando comportamentos esperados e condutas almejadas para um fim comum. Missão é aonde a organização quer chegar, um ponto futuro para a qual é desejado que todos dirijam seus esforços. Visão é o que ela vai estar fazendo quando chegar lá e os valores regem o como chegarão lá. Cada pessoa tem sua missão na vida, que precisa descobrir e pode construir uma visão do que seria alcançá-la e de que forma.

                O arquétipo do visionário inspira o sonho ou propósito de vida e a seguir firmemente no caminho da verdade que a autenticidade dos sonhos pedem. Os xamãs toltecas nos contam que as pessoas deveriam seguir quatro compromissos para trilhar um caminho digno, honrado e feliz na vida. Um deles é a impecabilidade com a palavra, dizer sempre a verdade ou aquilo que acredita que é certo. É claro que esta comunicação íntegra precisa avaliar o momento, o contexto e se o receptor está apto a ouvir. Os outros compromisso são: Não leve nada para o pessoal, não tire conclusões e dê sempre o melhor de si. Segundo Don Miguel Ruiz esses compromissos o levam a libertar da ilusão e ser fiel a sua própria verdade.

                Muitas pessoas não fazem contato com seus sonhos ou o colocam nas mãos de outros. Não se dão conta que valores ou compromissos regem suas vidas e muito menos por qual visão estão lutando.

                O que ocorre muitas vezes é uma neblina encobrindo a visão, são padrões de negação e indulgência. Quando vemos as coisas como queremos ver e não como elas realmente são. A sombra do Visionário é a abnegação, que se trata da renúncia a si mesmo por medo de perder o amor de alguém: “Se eu expressar o que eu vejo ele não vai mais gostar de mim”. Para obter aceitação e aprovação: “é melhor fingir ser outra pessoa”. Para manter a paz e o equilíbrio: “Melhor me calar diante das dificuldades.”

                Dizer a verdade sem críticas ou julgamentos, destrói padrões de negação, trazendo o confronto com a situação real e saindo da ilusão. A verdade às vezes pode doer, mas cria uma ponte de confiança e uma aproximação com o outro. Ter a coragem de ser quem somos é caminhar em direção oposta à abnegação. Para isto é importante observar se meu senso de auto-valorização está maior do que minha auto-crítica.

                Para acessar o visionário, sonhar e perceber sua própria verdade podemos lançar mão de alguns meios como: meditar, rezar, contemplar. Ninguém encontra o seu ser mais profundo com uma mente cheia de burburinhos. Respeitamos o visionário que há em nós quando damos voz ao que vemos, sentimos, sonhamos.

                Alguns xamãs fazem uma busca de visão no alto da montanha, onde passam dias sem comer e nem beber até que uma visão de vida apareça.  Uma introspecção profunda é acompanhada de uma revelação. Ás vezes ela vem quando estamos distraídos brincando saudavelmente. A autenticidade e espontaneidade aparecem quando estamos mais relaxados do que quando ansiamos por algo. Para isso basta observar uma criança, nossos pequenos mestres visionários.
Sílvia Rocha

 

 

domingo, 21 de setembro de 2014

Ansiedade


Ansiedade

“Viver bem a vida é um projeto ambicioso, mas de que vale a vida se não ousarmos vivê-la bem? (...) Se poetássemos e filosofássemos mais, adoeceríamos menos.” Julio Parreira

                Quem nunca sentiu ansiedade ao esperar um telefonema de emprego, um resultado de um concurso, de um exame médico, a volta de um filho à casa ou  a ligação de um paquera? Ansiar que algo aconteça ou não aconteça, de bom ou de ruim é viver num espaço de tempo entre o agora e o depois. Quem se atrasa para compromissos e não gosta de deixar ninguém esperando, também vive na ansiedade do tempo.

A ansiedade prepara o organismo para lutar ou fugir. É o que acontece quando temos uma preocupação, uma reação fisiológica natural:            Os batimentos cardíacos aumentam, a respiração fica mais superficial e rápida, preparando o corpo para agir: ataque ou defesa! Só que o que ocorre na maioria das vezes é que muito das preocupações que temos e das fantasias de coisas que podem vir a acontecer, não acontecem. O stress toma conta e a ansiedade é retroalimentada, generalizando-se e desenvolvendo um transtorno.

Essas fantasias catastróficas são causadas por um mundo interno em conflito, mais imaginário que real. É uma sensação de vulnerabilidade e desproteção, num cenário ameaçador onde o corpo físico sempre a postos não tem possibilidade de relaxar. As preocupações desproporcionais, além do limite do real,  tomam conta e caracterizam um transtorno de ansiedade generalizada. Esse estado de tensão acaba por criar dores no corpo, na cabeça, dificuldades na respiração ou sensação de nó na garganta, insônia, náuseas, tontura, sensação de irrealidade (estranheza com o ambiente ou consigo mesmo), calafrios, formigamento, taquicardia dentre outros.

A mente acelerada cria este estado de tensão ininterrupta. Pensamentos acelerados são decorrentes de um estilo de vida pouco natural e cheia de excessos. Excesso de informação, de trabalho mental, de uso de aparelhos eletrônicos, excesso de estímulos. Os pensamentos vêm quase autônomos, repetidos e persistentes, invadem a mente e ficam martelando. São preocupações incontroláveis com pensamentos perturbadores e a espera é pelo pior. Quando começam a atrapalhar as tarefas diárias é que normalmente a pessoa tenta pedir a ajuda, seja pelos sintomas físicos ou pelo sofrimento psíquico.

É muito gasto de energia e a criatividade que é responsável pela saúde mental da pessoa, fica embotada, debilitada. É hora de acordar e não esperar que a ansiedade quase enlouqueça para tomar uma providência. Dar-se conta de que a ansiedade está dominando e a qualidade de vida está prejudicada, é o primeiro passo. Assumir que tem ansiedade é ter consciência da dificuldade. Quem não se incomoda não vai fazer por onde mudar.  Ficar atento aos momentos mais críticos e que alerta ela vem mostrar: medo de perder alguém ou algo, medo de não dar conta, medo de ser criticado, medo de errar. A ansiedade tem a ver com medo e a falta de seu oposto: a confiança. Negar sua existência é permanecer no problema. Confrontá-lo é perceber para onde aponta o desequilíbrio.

O tratamento do transtorno de ansiedade generalizado vai desde uma consulta médica para medicação alopática ou natural até exercícios físicos, acupuntura, yoga, visualização e relaxamento, além de elaboração de conteúdos conflitantes internos numa psicoterapia.

Vivemos numa sociedade ansiogênica, onde o ritmo cobrado não é o ritmo natural do ser humano. Descansamos menos do que precisamos, temos menos lazer do que necessitamos, e nos relacionamos com os outros mais superficialmente do que nossa alma pede e ainda não sabemos onde buscar o equilíbrio. O corpo e a vida vão cobrar,  se continuarmos  assim. Trocar o atendimento às expectativas dos outros por um auto-atendimento. Buscar momentos de relaxamento, situações e relacionamentos que fortalecem, dar risadas, aproveitar o momento para ficar presente, sem lamentar o passado e nem ansiar o futuro.

Tem gente que acha normal viver comprimido. Relaxar dá culpa.  É preciso mais paciência e tolerância consigo mesmo e com o outro. Um belo exercício  para começar esta mudança de padrão é abrir um espaço de contemplação em algum momento do dia. Olhar o pôr do sol, admirar uma árvore que floresceu, um animal brincando, uma criança rindo, o som das maritacas, o céu estrelado...

A criatividade pode também alcançar outros momentos de relaxar e desopilar. O simples, o belo e natural encontrado na natureza pode inspirar os movimentos mais saudáveis e mais harmônicos para o nosso ser. Precisamos romper essa casca da segurança ilusória e encontrar o centro de nosso próprio ser, que acalma e traz serenidade.

Vivemos num tempo e num mundo onde ser feliz é ousadia! Como diz Gilberto Gil: “O melhor lugar do mundo é aqui e agora.”

 

Sílvia Rocha – Psicóloga – crp: 05/21756 contao: silviaayani@gmail.com

www.silviarenatarocha.blogspot.com.br

 

 

 

 

 

 

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Quem é o psicopata?




Quem é o Psicopata?


“Uma noite, um velho índio falou ao seu neto sobre o combate que acontece dentro das pessoas.
Ele disse:
– A batalha é entre os dois lobos que vivem dentro de todos nós. Um é Mau. O outro é Bom.

O neto pensou nessa luta e perguntou ao avô:
– Qual lobo vence?
O velho índio respondeu:
– Aquele que você alimenta!”

Um homem ou uma mulher, muito inteligente, e muito bem sucedido (a), sedutor (a) e manipulativo (a), que consegue o que quer sem culpa e nem pena de passar por cima do outro. Pode ser cruel e matar se preciso for para alcançar seus objetivos. Matar pode ser inclusive o objetivo. Mas não só os assassinos são psicopatas, muitos nem chegam a matar  e estão circulando entre nós. Muito comum achá-los em grandes empresas e na política. Segundo Guggenbuhl-Craig, analista junguiano, “O psicopata pode ser mais bem sucedido que os normais porque não está preso em neuroses e culpas”.

Numa entrevista de emprego, cativa, demonstrando segurança e charme. Já empregado, associa-se a pessoas influentes como meio de conseguir ascensão profissional. Disfarçados de amigos, podem semear desconfiança falando mal de pessoas, fazendo intrigas com habilidade e requinte. Descartam pessoas comose fosse uma coisa, caso este não sirva mais para seus intentos. Já numa posição mais elevada, exploram pessoas humilhando-as, desde que se mantenham no poder, podem se utilizar de meios perigosos e ardilosos.

Psicopatia ou Transtorno de Personalidade Antissocial, segundo o CID_10 (código internacional de doenças, código da OMS atualizado), é agrupado na classificação da Personalidade Dissocial, que inclui transtorno de personalidade amoral,  anti-social, associal, psicopática e sócio-pática. Dentre os principais sintomas estão: o desprezo por normas sociais, baixa tolerância à frustração, baixo limiar de descarga da agressividade, racionalização para culpar outros e se justificar perante  sucessivos conflitos com a sociedade. Os limites e regras são mal tolerados.

Sua grande capacidade de sedução passa por dizer o que é conveniente, podendo se tornar a pessoa que o outro gostaria que ele fosse. Mente, sem ter consciência da mentira, pois para ele verdade é o que ele fala. Muito charmoso e impulsivo, porém com emoções superficiais, mas podem dar um show de drama se for preciso, sem conexão real com o sentimento. Podem até incitar pena  como forma de manipulação. Não aprendem com punições pois não se sentem culpados e nem merecedores de castigo. Não tem compaixão e nem tem capacidade de amar. Sem problemas com a sexualidade estão sempre disponíveis e com ótimo desempenho sexual, porém não se conectam afetivamente com ninguém. Confundem excitação sexual com amor. Podem ser sádicos e agressivos no ato sexual se encontram pessoas masoquistas. Quem se relaciona intimamente com um psicopata, está no fundo evitando o amor.

A psicopatia não tem causa e nem tem cura, não adianta querer salvar ou ajudar um psicopata. Ele está completamente só.  Uma criança que fora violentada ou abusada sexualmente muito nova pode desenvolver uma neurose grave ou psicose, a psicopatia não é desenvolvida, o sujeito nasce assim e não tem jeito. É mesmo uma tragédia! Alguns psicopatas podem até cometer suicídio devido a tanta falta de sentido para a vida

Todos nós temos todas as patologias dentro de nós, nem que seja um pequeno traço.  E cada um tem um lado psicopata, uns mais, outros menos. Não precisa ser um Serial Killer para se dar conta da psicopatia interior. É preciso olhar para este lado que ri quando o outro cai, que se aproveita da infelicidade do outro, que conta vantagem ou que é incapaz de ter empatia passando por cima do outro. A incapacidade de ver o outro em suas necessidades, desejos ou medos e de usá-lo para benefício próprio é um traço psicopático. Tentar aniquiliar este lado é quase inútil, a inconsciência é o maior perigo. Dar-se conta deste lado sombrio é tê-lo nas mãos e não se deixar ser pega de surpresa por ele.

Pode-se compensar a psicopatia através de seu oposto: um moralismo exagerado e rígido, uma atenção compulsiva ao dever e à ordem. Quando um discurso parecer partidário demais, cuidado!  Pode esconder uma psicopatia.

Um psicopata clássico não tem cura mas nossos traços psicopáticos podem ser contornados. Aprendemos sobre ética e moralidade na infância quando fazemos algo errado e algum adulto vem chamar a atenção, e um sentimento de vergonha toma conta. Daí começa a se formar um valor ético em nossas vidas. A falta de amor e falta de moralidade existem nessa cultura psicopática em que vivemos. De que forma contribuímos para isso quando toleramos não sermos tratados com respeito? Ou quando toleramos ou fazemos pequenas transgressões sociais. 

Para existir um vilão, é necessário uma vítima. E para sair do lugar de vítima, entrar no da responsabilidade pelos atos como sujeitos ativos e criadores de realidades, com consciência do que estamos nutrindo em nossas vidas. Olhe ao redor e ao invés de reclamar, perceba que pequeno gesto ou atitude pode ser feito que poderá provocar e inspirar mudanças. Que possamos alimentar mais o amor, a solidariedade e sensibilidade humanas!

Sílvia Rocha – Psicóloga (CRP:05/21756), Especialista em Psicologia Analítica Junguiana, Arteterapeuta, Consteladora Familiar Sistêmica


 

 

 

 

domingo, 7 de setembro de 2014

O que é depressão?

O que é Depressão?

“Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências, mas nem mesmo percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas e os resultados somente através das experiências.” – C. G. Jung

“O que não nos mata, nos fortalece.”- Nieztche
 

                Segundo a Classificação Internacional de Saúde (CID-10), a depressão é considerada um transtorno de humor que pode ser classificado em leve, moderado ou grave, de acordo com a intensidade e quantidade de sintomas. Dentre os sintomas mais comuns são: Perda da capacidade e interesse por prazer, redução da energia vital, mudança de humor, diminuição das atividades, diminuição da auto-estima, da auto-confiança, idéias frequentes de culpa, auto-cobrança exagerada, diminuição da capacidade de concentração, fadiga, dores no corpo, raciocínio lento, esquecimento, lentidão psicomotora, agitação ou apatia, perda ou excesso de apetite, perda da libido e de interesse por relacionamentos, insônia ou excesso de sono, irritabilidade, ansiedade, sensação de fracasso, angústia, sentimento de desamparo, vazio existencial e falta de propósito de vida.

                Nos casos mais graves de depressão, a pessoa não sai da cama e não toma banho e pode desenvolver outras doenças clínicas levando-a a morte. Pode desenvolver delírios e alucinações psicóticas levando-as a acometer suicídio. A pessoa deprimida precisa de ajuda e ser levada a um atendimento médico e psicológico. Ela só consegue buscar essa ajuda sozinha quando a depressão está num estágio leve.

                Ficar triste em momentos da vida é perfeitamente normal, assim como temos passagens felizes também temos as tristes. Uma tristeza bem vivida e elaborada através de um luto, um período de recolhimento, faz a perda ser integrada na vida e uma nova energia ser colocada no lugar. Perda de um ente querido por morte, doenças, rompimento de relacionamento, desemprego, frustrações são motivos para tristeza, mas existe um tempo de recuperação esperado dependendo da resiliência – capacidade de recuperação - de cada um. Quando a tristeza se arrasta por muito tempo impedindo a pessoa de realizar coisas na vida, até mesmo de desempenhar suas atividades rotineiras, podemos pensar em depressão.

                Se existem mais pessoas da família com depressão, podemos considerar um componente hereditário. Na adolescência e juventude, o uso de drogas, álcool, medicamentos, conflitos internos ou com outras pessoas, podem levar à depressão. Também existe a depressão infantil com os mesmos sintomas dos adultos, acrescentando o desinteresse pelo brincar. Crianças que ficam muito tempo assistindo televisão, sendo bombardeadas por propagandas e valores consumistas, criam desde cedo uma ideia que o ter importa mais que o ser, ficando com seus corpos inertes e mentes aceleradas. Crianças devem brincar, correr, interagir, ficar ao ar livre, experimentar seu corpo e sua criatividade. Vídeo games desde novos por muito tempo também podem impedir que as crianças explorem atividades mais relacionais e sensoriais. Televisão e vídeo games devem ter seus usos controlados e limitados no tempo e outras brincadeiras e jogos, assim como materiais de arte oferecidos às crianças.

                O tratamento da depressão deve incluir a busca por um psiquiatra, por um psicólogo e pessoas que a ajudem a se inserir num contexto social. Frequentar grupos de apoio ou buscar pessoas amigas que estimulem o contato e o sentimento de pertencimento.  O afeto, a alegria dos encontros são bastante curativos. Uma pessoa deprimida não deve ficar sozinha e sim ter uma rede de pessoas e profissionais que a acolham.

                O trabalho psicológico da depressão passa por facilitar o contato da pessoa com suas próprias emoções. Tristezas e raivas reprimidas causam depressão. A raiva não expressa implode e se volta para a própria pessoa que trava sua energia vital. Ás vezes é mais fácil sentir raiva de si mesmo do que do outro, pois não existe uma permissão para sentir e expressar raiva por aquele que ama. E é essa mesma raiva que se canalizada com assertividade e não agressão, que vai colocar a pessoa de volta na vida, com firmeza e pro-atividade. Esse trabalho requer um guia, um terapeuta experiente que a auxilie nesse processo. A depressão segundo a terapia sistêmica pode significar, “alguém falta”, alguém que morreu e foi esquecido, ou o luto não foi devidamente realizado, a despedida não fora consumada. A depressão acaba por homenagear a pessoa que se foi fazendo com que a pessoa deprimida não viva plenamente.

                Algumas depressões são difíceis de se reconhecer, pois são disfarçadas. A pessoa continua fazendo tudo normalmente na sua vida mas com muita negatividade, pessimismo, reclamações e falta de perspectivas. São depressões leves mas que podem receber ajuda para  uma melhor qualidade de vida. Também devemos ficar atentos aos suicídios inconscientes em pessoas que fumam, bebem muito, usam drogas, fazem uma alimentação inadequada ou faltam cuidado com a saúde.

                Na visão junguiana, a depressão pode ser uma estratégia adaptativa, que como uma onda do mar, precisa se recolher para depois avançar. A depressão pode ser uma oportunidade de um grande mergulho interno para a preparação para o próximo momento de vida. Há que se legitimar as passagens da vida, para que elas realmente passem e se transformem em algo novo e que valham a pena.

Sílvia Rocha – Psicóloga, Arteterapeuta, Consteladora Familiar Sistêmica

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Encontro Terapêutico


Encontro terapêutico


“O encontro de duas personalidades se assemelha
ao contato de duas substâncias químicas:
se houver reação, ambas são transformadas.”
 Carl Gustav  Jung
“A ciência moderna ainda não produziu um medicamento tranquilizador
 tão eficaz como são umas poucas boas palavras.” S. Freud

                Quando uma pessoa busca uma psicoterapia, ela está precisando de ajuda para conduzir sua vida. Está querendo livrar-se de um sofrimento, seja na vida conjugal, no trabalho, um estado depressivo, doenças psicossomáticas, questões de identidade, financeira, dificuldades de relacionamento, angústia com os filhos, saúde frágil, etc. No modelo médico, é costume o paciente chegar com uma dor ou doença e o médico receitar remédios que curem ou amenizem aquele sofrimento. O diagnóstico e o tratamento são ditados pelo médico que estudou e tem um diploma. É colocado o poder da cura no médico.

Relacionar um sintoma com uma passagem difícil da vida, uma gripe com tristeza, uma úlcera com uma raiva reprimida, um infarto com um coração partido, uma doença ou um acidente que chegam para trazer uma nova percepção da vida, não é costume da maioria. Cuidados médicos são necessários, mas se a pessoa não refletir sobre suas enfermidades e desequilíbrios, vai continuar  as criando.  

Numa psicoterapia, o paciente também pode chegar esperando que o psicoterapeuta “tire” dele seus sintomas, cure sua dor, dê uma solução ao seu problema. Estamos vivendo a cultura do “Rivotril”. Este ansiolítico que é o remédio mais vendido do Brasil, é o símbolo da inconsciência, da anestesia dos nossos tempos. “Toma um remedinho que passa”. Passa provisoriamente, mas não cura, então não passa. E a pessoa vai continuar dependende a vida toda do remédio, se não tratar de arregassar as mangas e trabalhar em seu auto-conhecimento para reconhecer suas próprias forças.  Ansiedade é produzida pelo nosso modo de vida, assim como irritação, depressão, insônia. Essa sociedade competitiva, que exclui, de relações descartáveis, que carecem de sentido de vida e existência, produz uma série de desequilíbrios. Vivemos numa sociedade doente.

O que cura é o amor e todo o pacote que vem com ele: segurança, a confiança e o relaxamento. O amor vincula, faz aparecer o melhor de cada um. É disso que nossa sociedade está carente: de relações verdadeiras e não de relações utilitárias. No início de uma terapia, um paciente chega depositando no psicólogo um poder de cura, como se ele fosse um salvador, um deus ou deusa, um ser sobre-humano que será capaz de libertá-lo de seu sofrimento. Muito tentador para um terapeuta não treinado e inexperiente entrar nesse papel egóico de poder.

O que o psicoterapeuta faz é servir de espelho e de guia para que o paciente descubra sua própria dinâmica e soluções. Ele possui técnicas, uma abordagem que estudou e vivenciou através de sua própria análise e treinamento. Mas antes de tudo _ como diz C. G. Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.”_  ele possui a si mesmo como ferramenta de trabalho. Sua própria humanidade, suas emoções, seu caminho de vida percorrido. Ele pode compreender o outro porque também sente, porque já sofreu, porque já superou questões, porque se conhece e continua sempre seu trabalho de auto-conhecimento. Daí a importância tão grande de um terapeuta ter feito ou estar fazendo sua própria terapia.

Nesse processo, é imprescindível que se reconheça as emoções como aliadas no processo de crescimento. Elas são tidas geralmente num pensamento racional como desnecessárias e que precisam ser eliminadas. Daí o uso abusivo de medicamentos. As emoções são nosso mecanismo de defesa e de sobrevivência. Sendo assim se alguém sente medo de andar perto de um precipício, vai se afastar, assim como se tiver entrando num relacionamento difícil, vai recuar. O medo protege, tornando-se patológico quando vira um pânico devido a excesso de fantasias que podem ser tratadas.

Até a ansiedade tem sua função, sendo oposta à apatia, ela prepara o organismo para uma luta, para uma ação, antevendo que algo vai acontecer. Se é comum estar sempre produzindo este estado, é porque a pessoa está criando uma imagem do mundo e da vida como um lugar ameaçador. Remédios fazem relaxar, mas outros métodos que não viciam também, como exercícios físicos, relaxamentos conduzidos, mudanças de pensamentos e tratamentos psicológicos.

Num encontro terapêutico atualizamos as demandas da vida, temos um espaço para reflexão. O julgamento de certo e errado fica de fora, e as expressões humanas são acolhidas. Suporte e apoio são criados na relação terapêutica onde cada encontro é único. E é nessa relação afetiva-existencial e ao mesmo tempo profissional, que o amor próprio e o poder criativo podem ser recuperados, criando um ambiente de confiança para que diversas transformações internas aconteçam.

*Dedico este artigo a todos os psicólogos pelo dia do Psicólogo, (dia 27 de agosto)  com desejos de força, saúde e fé para continuarmos a tocar a alma humana.

Sílvia Rocha – psicóloga – crp: 05/21756, arteterapeuta, consteladora familiar sistêmica